segunda-feira, 11 de maio de 2009

Apanhando na Escola

No mês de fevereiro de algum dos primeiros anos da década de noventa, um moleque de dez anos de idade, recém-chegado à cidade, inicia seu primeiro ano ginasial em uma escola pública local.
Este rapazote, de origem abastada, foi motivo de chacota já no primeiro dia de aula: o único a comparecer com uma mochila de marca nas costas. Tardiamente descobriu que, como tribos distintas, cada cidade tem seus costumes e, na escola, cada faixa etária tem suas atitudes e costumes peculiares. Como antes disso o pobre coitado só havia frequentado uma única escola em sua vida, seria impossível para ele saber que, nessa cidade, o marco da puberdade era representado pelo material escolar levado na mão.
Desde o início taxado como bobinho e frágil, tornou-se o alvo das provocações juvenis. É estranho o comportamento do bicho homem, que desde cedo demonstra uma natural necessidade de auto-afirmação. Vencer faz um bem imenso ao ego, e as crianças ainda pequenas já sabem disso. As chacotas, as provocações e os desafios são meras representações dessa necessidade de estar por cima, e só se acentuam com o passar do tempo. Se o alvo é frágil e indefeso, melhor ainda, pois a vitória é certa.
Depois de aturar diversas provocações, o rapazote respondeu uma delas à altura. Paripassu foi jurado: “Te arrebento na saída!”.
Angustiado, pálido, trêmulo, dirigiu-se ao portão da escola, ladeado por uma multidão de espectadores. Na boca não encontrava um pingo de saliva sequer, e cada gole a seco raspava sua garganta taciturna.
A briga não tardou em começar e, para a surpresa dos presentes, o garoto mimado e frágil começou a levar vantagem sobre o outro. Porém, como que para defender a honra de um clã, surgiu um terceiro, que segurou as mãos do rapazote para trás, momento em que o outro moleque começou a espancá-lo. Socos no rosto, no abdômen, chutes nas pernas, nas canelas, nos genitais.
A covardia havia sido tacitamente justificada pelos valores histórico-sociais arraigados ao caso: um maricas que veio de escola particular não poderia ser capaz de bater em um moleque que se criou praticamente na rua, e um moleque criado na rua e estudante de escola do estado não poderia nunca superar as notas daquele.
Depois da sessão de espancamento, o moleque ficou sentado no chão, chorando, enquanto a multidão se esvaía paulatinamente. Pôde presenciar todo tipo de face: gente cochichando e rindo, gente séria, outros querendo se aproveitar de sua situação e “deixar o seu”. Nesse dia, esse menino conheceu o desejo de vingança, um sentimento amargo e quente, que começa no peito e se irradia por todos os membros do corpo.
No dia seguinte, a mãe do menino transferiu-o para uma outra escola estadual.

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